quarta-feira, 13 de abril de 2011

Sussurro - Capitulo 1

Coldwater, Maine
Dias atuais
Eu entrei na aula de biologia e meu queixo caiu. Misteriosamente aderido ao quadro-negro estava uma boneca Barbie, com Ken ao seu lado. Eles foram forçados a dar os braços e estavam nus, exceto por folhas artificiais colocadas em alguns lugares específicos. Rabiscado acima de suas cabeças em giz grosso rosa estava a convocação:
BEM VINDOS À REPRODUÇÃO HUMANA (SEXO)
Ao meu lado, Vee Sky disse, “É exatamente por isso que a escola proíbe câmeras de celular. Fotos disso no eZine seriam toda a evidência que eu precisaria para ir ao conselho da educação para remover biologia. E então teríamos essa hora para fazer algo produtivo – como receber monitoramento particular de veteranos gracinhas.”
“Ora, Vee,” eu disse, “Eu podia jurar que você estava esperando essa unidade o semestre todo.” Vee abaixou os cílios e sorriu maliciosamente. “Essa aula não vai me ensinar nada que eu já não saiba.”
“Vee? Tipo, virgem?”
“Não tão alto.” Ela piscou bem quando o sino tocou, mandando nós duas a nossos lugares, que eram lado a lado na nossa mesa compartilhada.
O Treinador McConaughy agarrou o apito balançando de uma corrente ao redor de seu pescoço e o assoprou. “Assentos, time!” O Treinador considerava ensinar biologia do segundo ano uma missão secundária de seu trabalho como treinador de basquete escolar, e todos sabíamos disso.
“Vocês podem não ter percebido que sexo é mais do que uma viagem de quinze minutos ao banco traseiro do carro. É ciência. E o que é ciência?”
“Uma chatice,” algum garoto no fundo da sala gritou.
“A única aula que eu estou reprovando,” disse outro.
Os olhos do Treinador examinaram a fileira da frente, parando em mim. “Nora?”
“O estudo de alguma coisa,” eu disse.
Ele andou até aqui e enfiou seu dedo indicador na mesa na minha frente. “O que mais?”
“Conhecimento ganho através de experimentos e observações.” Adorável. Eu soava como se estivesse fazendo um teste para um audiobook do nosso texto.
“Com suas próprias palavras.”
Eu toquei a ponta da minha língua com meu lábio superior e tentei um sinônimo. “Ciência é uma investigação.” Soava como uma pergunta.
“Ciência é uma investigação,” o Treinador disse, esfregando suas mãos juntas. “Ciência exigi que nós nos tranformemos em espiões.”
Colocado desse jeito, ciência quase soa divertido. Mas eu estivera na aula do Treinador tempo suficiente para não ter muitas esperanças.
“Uma boa investigação precisa de prática,” ele continuou.
“Assim como sexo,” veio outro comentário do fundo da sala. Todos nós engolimos a risada enquanto o Treinador apontava um dedo acusador para o transgressor.
“Isso não será parte da lição de casa de hoje a noite.” O Treinador virou sua atenção de volta a mim. “Nora, você está se sentando ao lado da Vee desde o começo do ano.” Eu assenti, mas tinha um mau pressentimento sobre onde isso estava chegando. “Ambas estão no eZine da escola juntas.” Novamente eu assenti. “Aposto que conhecem bastante uma sobre a outra.”
Vee chutou minha perna debaixo da nossa mesa. Eu sabia o que ela estava pensando. Que ele não fazia ideia do quanto conhecíamos uma sobre a outra. E eu não quero só dizer os segredos que enterramos em nossos diários. Vee é minha des-gêmea. Ela tem olhos verdes, cabelos loiro-marta, e alguns quilos acima de curvilínea. Eu sou uma morena de olhos esfumaçados com um volume de cabelo encaracolado que se mantém firme até mesmo contra a melhor chapinha. E sou só pernas, como um banquinho de bar. Mas há uma corda invisível que nos une; ambas juramos que esse laço começou bem antes do nascimento. Ambas juramos que continuará seguro pelo resto das nossas vidas.
O Treinador deu uma olhada na sala. “De fato, eu aposto que cada um de vocês conhece a pessoa sentando ao lado de você bem o bastante. Vocês escolheram os assentos que escolheram por uma razão, certo? Familiaridade. Que pena que os melhores detetives evitam familiaridade. Ela entorpece o instinto investigativo. E é por isso que, hoje, vamos criar um novo mapa de assentos.”
Eu abri minha boca para protestar, mas Vee chegou antes. “Mas que porcaria? É abril. Tipo, quase o final do ano. Você não pode mexer nesse tipo de negócio agora.”
O Treinador deu um vestígio de sorriso. “Eu posso mexer nesse negócio até o último dia do semestre. E se você reprovar na minha aula, você estará de volta aqui no ano que vem, onde eu estarei mexendo nesse tipo de negócio novamente.”
Vee fez uma carranca para ele. Ela é famosa por aquela carranca. É um olhar que faz tudo, exceto sibilar audivelmente. Aparentemente imune a ele, o Treinador trouxe seu apito aos lábios, e captamos a ideia.
“Cada parceiro sentado no lado esquerdo da mesa – a esquerda de vocês – mova-se um assento para frente. Aqueles na fileira da frente – sim, incluindo você, Vee – movam-se para os fundos.”
Vee enfiou seu caderno dentro de sua mochila e arrebentou o zíper ao fechar. Eu mordi meu lábio e acenei um pequeno adeus. Então eu me virei ligeiramente, checando a sala atrás de mim. Eu conhecia os nomes de todos os meus colegas de sala... exceto um. O transferido. O Treinador nunca o chamou, e ele parecia preferir desse jeito. Ele se sentava desleixadamente uma mesa atrás, gelados olhos negros encarando à frente firmemente. Exatamente como sempre. Eu nem por um momento acreditava que ele simplesmente sentava lá, dia após dia, encarando o vazio. Ele estava pensando algo, mas o instinto me dizia que eu provavelmente não queria saber o que.
Ele assentou seu livro de biologia na mesa e deslizou na antiga cadeira da Vee.
Eu sorri. “Oi. Eu sou a Nora.”
Seus olhos negros me cortaram, e os cantos de sua boca inclinaram-se para cima. Meu coração errou uma batida e naquela pausa, um sentimento de triste escuridão pareceu deslizar como uma sombra sobre mim. Ele sumiu em um instante, mas eu ainda estava encarando-o. Seu sorriso não era amigável. Era um sorriso que soletrava encrenca. Como uma promessa.
Eu me foquei no quadro negro. A Barbie e o Ken encararam de volta com sorrisos estranhamente alegres.
O Treinador disse, “Reprodução humana pode ser um assunto pegajoso –”
“Uiii!” resmungou um coro de estudantes.
“É preciso um manuseamento maduro. E como toda ciência, a melhor abordagem é aprender a investigar. Pelo resto da aula, pratiquem essa técnica descobrindo o quanto puderem sobre seu novo parceiro. Amanhã, tragam em
escrito suas descobertas, e acreditem em mim, eu vou checar a autenticidade. Isso é biologia, não inglês, então nem pensem em ficcionalizar suas respostas. Eu quero ver interação e trabalho em equipe reais.” Havia um Ou então implícito.
Eu me sentei perfeitamente imóvel. A bola estava no campo dele – eu tinha sorrido, e olha como isso ajudou. Eu enruguei meu nariz, tentando descobrir a que ele cheirava. Não a cigarros. Algo mais profundo, mais asqueroso.
Charutos.
Eu encontrei o relógio na parede e bati meu lápis na hora da segunda mão. Eu plantei meu cotovelo na mesa e apoiei meu queixo no meu punho. Eu soprei um suspiro.
Ótimo. A esse ponto eu iria falhar.
Eu estava com meus olhos fixos a frente, mas eu ouvi o suave deslizar de sua caneta. Ele estava escrevendo, e eu queria saber o que. Dez minutos sentados juntos não o qualificava para fazer qualquer suposição sobre mim. Movendo um olhar lateral, eu vi que seu papel tinha várias linhas escritas e estava crescendo.
“O que você está escrevendo?” eu perguntei.
“E ela fala inglês,” ele disse enquanto rabiscava, cada pincelada de sua mão suave e preguiçosa ao mesmo tempo.
Eu me inclinei o mais perto dele que eu ousava, tentando ler o que mais ele tinha escrito, mas ele dobrou o papel ao meio, escondendo a lista.
“O que você escreveu?” Eu exigi.
Ele esticou a mão para o meu papel não-usado, deslizando-o pela mesa na direção dele. Ele o amassou em uma bola. Antes que eu pudesse protestar, ele o jogou numa lata de lixo ao lado da mesa do Treinador. O arremesso caiu dentro.
Eu encarei a lata de lixo por um momento, presa entre a descrença e a raiva. Então eu abri meu caderno em uma página em branco. “Qual é o seu nome?” Eu perguntei, o lápis pronto para escrever.
Eu olhei para cima a tempo de captar outro sorriso sombrio. Esse parecia me desafiar a arrancar qualquer coisa dele.
“Seu nome?” Eu repeti, esperando que fosse minha imaginação minha voz ter vacilado.
“Me chama de Patch. Sério. Me chama.”
Ele piscou quando disse isso, e eu estava bem certa de que ele estava me zoando. “O que você faz nas suas horas de ócio?” eu perguntei.
“Eu não tenho tempo livre.”
“Presumo que essa tarefa vale nota, então me faz um favor?”
Ele se reclinou em seu assento, dobrando seus braços atrás de sua cabeça. “Que tipo de favor?”
Eu tinha bastante certeza de que isso uma indireta, e eu lutei por um jeito de mudar de assunto.
“Tempo livre,” ele repetiu pensativamente. “Eu tiro fotos.”
Eu copiei Fotografia no meu papel.
“Eu não terminei,” ele disse. “Eu tenho uma bela coleção de uma colunista de eZine que acredita que há verdade em comer organicamente, que escreve poesia em segredo, e que estremece ao pensar em ter que escolher entre Stanford, Yale, e... qual é aquela grandona com H?”
Eu o encarei por um momento, balançada por ele ter acertado na mosca. Eu não tinha o pressentimento de que era um chute. Ele sabia. E eu queria saber como – agora.
“Mas você não acabará indo para nenhuma delas.”
“Eu não irei?” Eu perguntei sem pensar.
Ele prendeu seus dedos debaixo do assento da minha cadeira, me arrastando para mais perto dele. Não certa se deveria escapar e mostrar medo, ou fazer nada e fingir tédio, eu escolhi o último.
Ele disse, “Embora você prosperasse nas três escolas, você as desdenha por serem um cliché em realização. Julgar é sua terceira maior fraqueza.”
“E minha segunda?” Eu disse com bastante raiva. Quem era esse cara? Essa era algum tipo de piada perturbadora?
“Você não sabe como confiar. Eu retiro o que disse. Você confia – só que nas pessoas erradas.”
“E o meu primeiro?” Eu exigi.
“Você mantém a vida numa coleira curta.”
“O que isso quer dizer?”
“Você tem medo do que não consegue controlar.”
O cabelo na minha nuca ficou de pé, e a temperatura na sala pareceu esfriar. Normalmente eu teria ido diretamente para a mesa do Treinador e pedido um novo mapa de assentos. Mas eu me recusava a deixar Patch pensar que ele podia me intimidar ou assustar. Eu senti uma necessidade irracional de me defender e decidi bem ali e agora que eu não recuaria até que ele recuasse.
“Você dorme pelada?” ele perguntou.
Minha boca ameaçou cair, mas eu a segurei no lugar. “Você está longe de ser a pessoa a quem eu contaria.”
“Já foi a um psiquiatra?”
“Não,” eu menti. A verdade era que eu tinha consulta com o psicólogo da escola, Dr. Hendrickson. Não era por escolha, e não era algo que eu gostasse de falar sobre.
“Fez algo ilegal?”
“Não.” Ocasionalmente passar do limite de velocidade não contaria. Não com ele. “Por que você não me pergunta algo normal? Como... meu tipo favorito de música?”
“Eu não vou perguntar o que eu posso adivinhar.”
“Você não sabe o tipo de música que eu escuto.”
“Barroco. Com você, tudo é ordem, controle. Eu aposto que você toca... violoncelo?” Ele disse isso como se tivesse chutado do nada.
“Errado.” Outra mentira, mas essa enviou um arrepio pela minha pele que deixou meus dedos formigando. Quem era ele, realmente? Se ele sabia que eu tocava violoncelo, o que mais ele sabia?
“O que é isso?” Patch deu um tapinha com sua caneta no interior do meu pulso. Instintivamente eu recuei.
“Uma marca de nascença.”
“Parece uma cicatriz. Você é suicida, Nora?” Seus olhos se conectaram com os meus, e eu pude sentir ele rindo. “Pais casados ou divorciados?”
“Eu moro com a minha mãe.”
“Onde está o pai?”
“Meu pai morreu ano passado.”
“Como ele morreu?”
Eu hesitei. “Ele foi – assassinado. Esse é um território meio pessoal, se não se importa.”
Houve uma contagem de silêncio e a beirada dos olhos de Patch pareceu suavizar um pouco. “Isso deve ser duro.” Ele soava sério.
O sino tocou e Patch estava de pé, caminhando em direção a porta.
“Espera,” eu chamei. Ele não se virou. “Com licença!” Ele tinha passado pela porta. “Patch! Eu não peguei nada sobre você.”
Ele se virou e andou na minha direção. Tomando minha mão, ele rabiscou algo nela antes de eu a puxar.
Eu olhei para baixo para os sete números em tinta vermelha na minha palma e fechei a mão ao redor deles. Eu queria dizer a ele que de jeito nenhum seu telefone tocaria hoje a noite. Eu queria dizer a ele que era culpa dele por tomar todo o tempo me questionando. Eu queria um monte de coisas, mas eu só fiquei parada lá parecendo como se não soubesse abrir minha boca.
Por fim eu disse, “Estou ocupada hoje a noite.”
“Assim como eu.” Ele sorriu e se foi.
Eu fiquei pregada no lugar, digerindo o que tinha acabado de acontecer. Ele tinha comido todo o tempo me questionando de propósito? Para que eu falhasse? Ele achava que um relampejo de sorriso o redimiria? Sim, eu pensei. Sim, ele achava.
“Eu não vou ligar!” Eu gritei depois dele. “Não – nunca!”
“Você terminou a sua coluna para o prazo de amanhã?” Era a Vee. Ele apareceu ao meu lado, anotando no caderno que ela carregava para todo lugar. “Estou pensando em escrever a minha sobre a injustiça do mapa de assentos. Eu fiquei com uma garota que disse que tinha acabado um tratamento para piolho essa manhã.”
“Meu novo parceiro,” eu disse, apontando no corredor para as costas de Patch. Ele tinha um andar irritantemente confiante, do tipo que você acha combinado com camisetas desbotadas e um chapéu de caubói. Patch não usava nenhum dos dois. Ele era um garoto do tipo Levi’s-escura-jaqueta-escura-botas-escuras.
“O veterano transferido? Acho que ele não estudou o bastante da primeira vez. Ou da segunda.” Ela me deu um olhar astucioso. “Na terceira ele tem sorte.”
“Ele me dá arrepios. Ele conhecia a minha música. Sem qualquer dica, ele disse, ‘Barroco’.” Eu fiz uma péssima imitação de sua voz baixa.
“Chute de sorte?”
“Ele sabia.... outras coisas.”
“Como o quê?”
Eu soltei um suspiro. Ele sabia mais do que eu queria contemplar confortavelmente. “Tipo como me enlouquecer,” eu disse por fim. “Eu vou dizer ao Treinador que ele tem que nos trocar de volta.”
“Vai nessa. Eu podia ter um gancho para o meu próximo artigo no eZine. ‘Segunda-anista Defende-se.’ Melhor ainda, ‘Mapa de Assento Leva um Tapa na Cara.’ Hmm. Eu gostei.”
No final do dia, fui eu quem levou um tapa na cara. O Treinador recusou meu pedido para repensar o mapa de assentos. Parecia que eu estava presa com o Patch.
Por ora.

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